Meio Ambiente

Dia Nacional da Caatinga!

Muitos de nós temos na lembrança as famosas cenas dos personagens Chicó e João Grilo em O Auto da Compadecida (2000), obra de Ariano Suassuna adaptada ao cinema por Guel Arraes, caminhando em vastas terras semiáridas, povoadas de gente, ainda que esparsamente, e também povoadas de imaginação e biodiversidade! O filme foi gravado em Cabaceiras, na Paraíba, no coração do semiárido paraibano. 

Outro filme que recentemente colocou nas telonas as paisagens da Caatinga foi Bacurau (2019) – dirigido por Kleber Mendonça Filho e gravado em Parelhas, Rio Grande do Norte – que se passa numa distopia futurista que não deixa de retratar um pouco da nossa presente realidade no Brasil. 

A própria ave que dá nome ao filme, o bacurau (Nyctidromus albicollis), é uma das muitas espécies que compõem essas paisagens que guardam tesouros que nos conectam ao passado – como  o Sítio Arqueológico Itacoatiaras do Rio Ingá, na Paraíba – e ao futuro, com as inovadoras técnicas de irrigação que fazem do Rio Grande do Norte o maior produtor de melão do Brasil. 

A Caatinga se estende pelo Nordeste brasileiro e pelo norte de Minas Gerais e é um bioma único do Brasil, ao contrário, a título de exemplo, dos biomas Amazônia e Pantanal, compartilhados entre diversos países da América do Sul. Além disso é a região semiárida mais populosa e biodiversa do mundoVem com a gente homenagear esse nosso bioma tão rico e tão importante para o planeta no dia da Caatinga!

História da data

A data foi criada por meio do Decreto Federal de 20 de agosto de 2003 e faz alusão ao nascimento do professor, engenheiro agrônomo, ambientalista e ecólogo João de Vasconcelos Sobrinho, no Recife, em 1908. 

O homenageado foi um importante agente na conservação de espécies nativas do Brasil, como o Pau-Brazil, Pau Jangada e Ipê, e um dos criadores da Estação Ecológica de Tapacurá, localizada em São Lourenço da Mata, Pernambuco, em 1975

Afinal, o que significa Caatinga?

A palavra tem sua origem no tupi e significa mata (‘ka) branca (tinga), dado que muitos ipês florescem com a cor branca além do aspecto esbranquiçado de muitas outras espécies de arbustos e árvores que perdem suas folhas nas épocas mais secas, em oposição às florestas “verdes”. Mas não se engane! Perder as folhas significa para as árvores reter mais água e economizar recursos em tempos difíceis.

Curiosidades sobre o bioma

Listamos abaixo algumas curiosidades a Caatinga: 

  • A área da Caatinga é de 844.453 Km², segundo o IBGE;
  • O clima predominante na Caatinga é o semiárido, o que é uma das características marcantes do bioma, por tal clima ser um dos mais quentes do planeta. Dividido entre o período chuvoso (de 3 a 5 meses) e seco (entre 7 e 9 meses)
  • Existem esforços consideráveis para a reintrodução das ararinhas azuis, extintas da natureza, que viviam originalmente na Caatinga. A previsão é que elas passem por um momento de adaptação para depois serem reintroduzidas na natureza; 
  • Desde a colonização, a Caatinga sofreu diversos processos de degradação e é urgente a mobilização da sociedade para a urgência de sua preservação;
  • Existe na Caatinga, mais precisamente no sertão da Bahia, a maior concentração de sítios arqueológicos do Brasil! São cerca de 3 mil! Os sítios estão localizados no Parque Nacional do Boqueirão da Onça e revelam muito sobre a origem da ocupação humana na América do Sul. O parque não está aberto à visitação;

Aproveite e saiba mais sobre o Patrimônio Arqueológico Brasileiro, clicando aqui.

Você realmente conhece a Caatinga?

Por muito tempo, o bioma foi negligenciado pela administração pública, atingindo melhorias sociais significativas nos idos de 2002 a 2016. Apesar de pouco estudado por falta de recursos, a Caatinga nos proporciona muito mais do que se imagina! 

Os anos se passaram e mesmo sendo a Caatinga o bioma brasileiro menos preservado, ela é um bioma riquíssimo em biodiversidade!  Existem cerca de 371 espécies nativas de peixes, 98 de anfíbios, 224 de répteis, 548 de aves e 183 mamíferos. Quando falamos da flora do bioma, outro indica-se a existência de quase 3,2 mil espécies, sendo muitas delas endêmicas (únicas) do bioma; 

Outro fator, já comprovado, é o seu papel no equilíbrio do clima, já que apresenta alta eficiência na absorção do gás carbônico.

A desinformação e outros fatores, estimularam e justificaram a sua exploração e destruição desenfreadas ao longo do tempo e causaram danos irreversíveis. Estima-se que apenas 7,8% do território da Caatinga está protegido.

Por este e outros motivos, sua exploração e destruição foram desenfreadas e provocadas, principalmente, pelo mau uso do solo e queimadas da vegetação nativa e sua subsequente substituição por pastagens, problema sistemático na história recente brasileira. 

Hoje, este bioma é tido como o bioma da resistência, devido às explorações sofridas durante os anos desenvolvimentistas nos idos das décadas de 1950 e 1990, como é o caso da queima de lenha para fabricação de carvão, do cultivo de fibras (como algodão) com técnicas ultrapassadas de manejo do solo, a mineração, a pecuária, entre outros.

Tais intervenções intensificaram e criaram problemas como a seca, no primeiro caso e, no segundo caso, a fome, desigualdade social, destruição do meio ambiente, êxodo rural, entre outros. O que, aliado aos aspectos naturais, resultou na fragilidade e desigualdade da região. Neste sentido, cientistas apontam que a Caatinga é um dos biomas mais vulneráveis ao aquecimento global e das ações insustentáveis. 

Porém, mesmo diante de tal cenário, a Caatinga vive. Em diversidade, em unidade, em cultura e maravilhas. Não é  à toa que recebe tantas homenagens na poesia, na música, no cinema, no teatro e por aí vai…

A destruição da Caatinga

Os maiores problemas enfrentados na região, atualmente, são:

  • Queimadas; 
  • Expansão mal planejada da agricultura; 
  • Desigualdade de divisão de terras; 
  • Pobreza; 
  • Desertificação;

Alguns dados sobre o desmatamento da Caatinga:

  • Em média, por dia, 120 hectares são desmatados;
  • Entre novembro de 2018 e outubro de 2021,130.693 hectares de floresta foram derrubados;
  • 13% do semiárido já está em processo avançado de desertificação

Algumas causas do desmatamento:

  • aumento da pecuária extensiva;
  • mineração desenfreada e sem precedentes legais;
  • uso de lenha como fonte de energia para famílias e empresas;
  • falta de pesquisas e dados que propiciem a execução de projetos de conservação e de reflorestamento.

Mas o que a Caatinga precisa?

Como citamos anteriormente, um dos maiores fatores que causam a destruição do bioma, é a agricultura e a retirada de lenha. Por esse motivo, é essencial e urgente que algumas medidas políticas públicas sejam adotadas para regulamentar tais atividades em prol da biodiversidade da região. A Caatinga é alvo de exploração de grandes organizações e dos seus habitantes. Entretanto, tal questão não recebe o foco necessário para o controle destas atividades, mesmo sendo uma das principais influências no processo de desertificação que assola o bioma a décadas.

Em relação aos pequenos agricultores, é sabido que o bioma abriga cerca de 29,6 milhões de habitantes e, em média, 9,5 milhões sobrevivem da agricultura. Porém, tal atividade é praticada de forma arcaica, o cultivo não é dotado de técnicas modernas, se tornando, assim, exaustivo e predatório. Isso ocorre, pois a maioria da população não possui recursos e conhecimentos suficientes para adotar métodos seguros e sustentáveis.

E é aí que as políticas públicas entram: dar condições ao agricultor e a todos eles, de forma democrática, de viverem da sua atividade, mas de forma a não prejudicar o meio ambiente. Condições financeiras e conhecimento suficientes para entender a importância da adoção de tais técnicas, como adotá-las, sobre a dinâmica que envolve os recursos naturais, sobre os impactos das suas ações, entre tantos outros pontos que envolvem o assunto.

Entretanto, apesar desta ser uma medida necessária, é um mito pensar que a população vulnerável e os pequenos agricultores são os maiores responsáveis pela destruição do bioma. Muito pelo contrário! São eles a enfrentarem, além das dificuldades no desempenho de suas atividades e na vida, em geral, o problema energético, que torna o uso da lenha essencial. Ainda que a região tenha alto potencial de produção de energias limpas, como a eólica e a solar.

Tal problema, apesar de enfrentado pelos mais vulneráveis, é fruto de uma ineficiência dos governos federais, estaduais e municipais, em fornecer energia, no ato de permitir a atividades de extração da lenha e na sua fiscalização. E, apesar de prejudicar muito mais a população de baixa renda, a lenha é majoritariamente consumida por empresas como as do ramo de biocombustível, carvão, gesso e cerâmica. 

Por isso, o foco das políticas públicas deve ser a regulamentação das atividades praticadas por empresas na região, visando o incentivo a práticas sustentáveis e a punição daquelas que não sejam.

Além disso, o Estado deve se atentar à promoção de dados referentes ao bioma. É imprescindível que a Caatinga seja valorizada como um bioma expressivo e de grande importância socioeconômica, ecológica e cultural para o país e para o mundo. Que as suas especificidades sejam estudadas e que a sua preservação seja priorizada e incentivada. Que se desconstruir estigmas formados sobre a sua biodiversidade e disseminem tudo que há de único em relação à fauna, flora, cultura, costumes e muito mais!

Além do essencial reflorestamento, é preciso se aprofundar em todos os problemas que atingem a Caatinga, para assim, a partir de estudos, desenvolver políticas sobre todas as razões socioeconômicas que sustentam o cenário atual de desmatamento. Assim será possível gerar a educação necessária, que atinja a população de forma democrática, sanar as suas necessidades sociais, culturais e econômicas e incentivá-los/instruí-los quanto à realização de práticas e atividades sustentáveis.

O futuro da Caatinga em nossas mãos

Sabemos que como membros da raça humana temos certa responsabilidade pelo que se passa em nosso planeta, sobretudo no que diz respeito à contaminação. No dia de hoje, pensemos a respeito de nossas ações sobre o meio ambiente e sobre como apoiar instituições que existem e trabalham para preservar o bioma. 

Observar e aprender com as comunidades tradicionais e os povos originários e sobre a forma como desempenham suas atividades de maneira sustentável é uma boa pedida para uma sociedade que ainda não se adaptou à ideia da finitude dos recursos naturais. 

Já pensou em praticar ecoturismo na Chapada Diamantina? Ou visitar a cidade natal de Luiz Gonzaga? E a literatura? Que tal uma obra de Rachel de Queiroz? A Caatinga é nosso patrimônio e conhecê-la e divulgá-la ajuda muito em sua conservação.

Escrito por Davi Maia e Júlia Balsamão

Ius Natura

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